Não tem com negar que o Studio Ghibli consegue criar animações incríveis, emocionantes que mobilizam os sentimentos de forma única e arrebatadora. Além dos sucessos como A Viagem de Chihiro (Sen to Chihiro no Kamikakushi) ou O Castelo Animado (Hauru no Ugoku Shiro), As Memórias de Marnie (Omoide no Marnie) é um convite a refletir sobre como lidar com questões familiares, amizades e culpa.
SOBRE O FILME
Filme inspirado no livro de 1967 da britânica Joan G. Robinson, conta a trajetória do encontro entre Anna e Marnie. Enquanto Anna é uma garota introvertida com forte complexo de inferioridade, se muda temporariamente para o interior por recomendações médicas e se torna amiga de Marnie, uma garota alegre, radiante e que por trás dos cabelos loiros existe um grande mistério que envolve sua amizade.
As Memórias de Marnie foi dirigido por Hiromasa Yonebayashi, antes Isao Takahata e Hayao Miyazaki declararem aposentadoria sendo indicado ao Oscar de Melhor Animação em 2016.
AS PROTAGONISTAS
Lidar com questão sobre autoaceitação é um tema discutido com frequência atualmente, ainda mais quando o cenário induziu, querendo ou não, o aumento relativo de sentimentos gerado pela ansiedade, por exemplo. No caso estamos falando de uma animação de 2014, ou seja, temas como esse estão muito longe de serem encerrados, muito pelo contrário. Anna, a querida protagonista, sofre de asma e a solução foi uma vigem ao interior onde teve mais contato com a natureza e, por que não, conhecer pessoas novas e estabelecer novas amizades.
Acontece que Anna se acha completamente incapaz de aproximar de qualquer pessoa, pois em toda ocasião acreditar ser um fardo. Quando muito jovem, perdeu seus pais em um acidente de carro e não demorou muito para sua avó também falecer. Sem parentes próximos, Anna foi adotada por sua tia Yoriko onde morem em Sapporo, porém o sentimento de culpa se agravou quando descobre que eles recebem ajuda financeira do governo, fazendo acreditar que ela teria apenas aceitado a adoção pelo dinheiro. Por causa dos problemas de socialização, Anna expressa todos os sentimentos com ajuda do lápis e borracha transformando-as em belos desenhos.
Marnie é extremo oposto de Anna. Feliz, contente, mas nem tudo são flores. Marnie se sente tão solitária quando sua amiga. Por mais que tivesse todos os brinquedos do mundo, nada iria suprir a falta que sentia dos pais que viviam em longas viagens e por fim era cuidada por empregados abusivos. Infelizmente a criança foi negligenciada pelos pais.
ALÉM DA IMAGINAÇÃO
Logo quando Ana chegou à casa dos parentes, enxergou uma ótima oportunidade e inspiração para seus desenhos e logo se encanta com a “Casa do Pântano” e o mistério ao seu redor. Motivada pela curiosidade, todas as noites vai até a casa até conhecer Marnie, mesma garota que vê em seus sonhos. A conexão das duas foi instantânea e intensa. É de se estranhar como Anna se sentiu tão confortável com a presença de uma completa desconhecida.
Sua união faz ponte entre o real e o imaginário, o passado e o presente, além da cumplicidade mútua pela história de vida semelhante. O longa traz alternativas sobre como enfrentar esse tipo de situação. Marnie, por exemplo, teve todos os motivos para se culpar, mas ela encara a solidão de forma confiante, esperançosa que tudo poderia mudar num passe de mágica. Sem contar com a visão otimista de se aproveitar ao máximo todos os instantes da vida. Já Anna se resguardou em seus desenhos e não se permitia amadurecer vínculos com as crianças da mesma idade.
O encontro foi a quebrada de barreiras necessária para ambas evoluírem emocionalmente principalmente em relação a Anna. Isso se torna visível com a mudança de feição da personagem cada vez que o nome Marnie era citado. De tão surreal, Anna acreditou que tudo era fruto da sua imaginação que Marnie, na verdade, era a versão imaginária do que gostaria de ser. No fim das contas, Marnie precisava do seu perdão, pois é sua avó falecida que sentia culpada por ter “abandonado” após a morte dos seus pais e Anna precisa se libertar da culpa de achar que era um peso morto. Graças as lembranças de sua avó, foi possível entender suas raízes e se livrar desse sentimento de uma vez por todas. Resumindo, uma amizade além da imaginação.
Por fim, a animação é lindíssima, um show de belas fotografias e não canso de rever. Confesso que O Castelo Animado ainda é meu preferido deles. Enfim, incrível.
Disponível na Netflix