LET IT BE e LET IT BE… NAKED

Let it Be

Let It Be, apesar de ser conhecido por muitos como o último álbum da carreira dos Beatles, foi na verdade, o penúltimo, tendo sido gravado no início de 1969 e sendo lançado apenas em 1970 por complicações e discordâncias nas escolhas dos takes e nos arranjos sonoros.

Paul McCartney, que estava liderando o projeto – como já vinha fazendo há alguns anos – pretendia que o álbum tivesse 14 músicas, mas apenas 12 foram lançadas. Algumas dessas faixas remanescentes acabaram sendo aproveitadas no álbum seguinte, Abbey Road. Ainda assim, as músicas que não foram aproveitadas nesses últimos álbuns apareceram nos discos de estreia solo dos ex-beatles, como por exemplo, “All Things Must Pass” e “Isn’t a Pity” de George Harrison, “Gimme Some Truth” e “Jealous Guy” de John Lennon, “Junk” e “Teddy Boy” de Paul McCartney.

A Produção do Álbum

A ideia inicial era fazer com que os Beatles voltassem às suas origens, que era de gravar álbuns de estúdio ao vivo. Essa ideia também incluía uma apresentação ao vivo, coisa que a banda já não fazia desde 1966. Em termos atuais, todo o projeto seria um verdadeiro fan service e justamente por isso o álbum se chamaria Get Back, mas acabou tendo o nome alterado para Let It Be, pois os produtores acreditaram que este era o single com mais potencial entre todas as faixas, o que realmente acabou sendo comprovado.

Phil Spector foi o produtor responsável pelos arranjos e mixagens de todas as faixas do álbum. Mas apesar do sucesso, o resultado não agradou muito a McCartney, que acreditou que as edições estragaram a essência e o objetivo do álbum. Em outras palavras, Phil Spector complicou algo que deveria ser simples, o que não significa que o resultado final tenha sido ruim, mas o já conhecido perfeccionista, Paul McCartney – apesar de ser tido como chato por algumas pessoas – tinha razão neste caso.

Depois de muitos de briga na justiça, Paul finalmente conseguiu que o “álbum original” fosse lançado, dessa vez sem as mixagens extravagantes de Spector. O resultado foi Let It Be… Naked, lançado em 2003, um álbum que poderia ser bem resumido como “voz e violão”. Nele é possível notar a maestria dos Beatles não em apenas fazer música boa, mas em fazer excelentes apresentações ao vivo, fato que fez a banda se destacar desde que tocavam no Cavern Club de Liverpool e eram conhecidos como “The Quarrymen”.

As Faixas do Álbum

A primeira faixa do álbum é Two of Us, uma composição de Paul McCartney dedicada a sua esposa, Linda. Ela tem uma sonoridade pop-country e é muito nostálgica por trazer, depois de muitos anos, John e Paul dividindo o mesmo microfone – ainda que não literalmente. Os dois mantém o dueto durante toda a música, misturando a doçura da voz de Paul com a acidez na voz de John, tudo em perfeita harmonia.

Dig a Pony, composta por John, revela um pouco do seu amor – para alguns, obsessivo – por Yoko Ono, no verso “All I Want Is You” acaba soando um pouco semelhante à faixa “I Want You (She’s so Heavy)” mas que aparece apenas no Abbey Road. Aqui, quem está no teclado é Billy Preston, que fez praticamente um papel de quinto Beatle em todo o álbum.

Across the Universe, outra composição de John, é uma música remanescente da era psicodélica dos Beatles e isso é um fato tão notável que a sua sonoridade se encaixaria perfeitamente em Revolver, Magical Mystery Tour e The Beatles (Álbum Branco). A letra supostamente teria surgido 1968, depois de uma discussão – e crise existencial – de Lennon com a sua, até então esposa, Cynthia Powell.

I Me Mine é uma composição de George Harrison. A letra supostamente trata a respeito das brigas de ego dentro dos Beatles e na diferença que o George sentia entre o clima pesado da banda e a leveza de gravar com Bob Dylan e a sua banda. Aliás, a amizade entre eles era tanta que ambos chegaram a trabalhar juntos no disco duplo de All Things Must Pass, no qual George se inspirou muito em Dylan em algumas faixas.

Dig It é uma curta composição de John em homenagem a “Like a Rolling Stone” de Bob Dylan ao mesmo tempo que tira o sarro com a faixa seguinte, Let It Be, que é conhecida por ser muito religiosa e espiritual. As “músicas boazinhas” de Paul sempre foram alvos de piada, especialmente de John Lennon.

O Single Let it Be

Let It Be é uma das mais famosas músicas dos Beatles e de Paul McCartney, porém tem uma história um pouco controversa. Isso porque Paul alega ter sonhado com sua mãe que dizia “Let It Be”. Porém, há também outra versão que diz que a ideia veio de Malcolm Evans (um dos gerentes dos Beatles, mais conhecido como Mal Evans) que havia “sussurrado palavras de sabedoria” para o seu amigo Paul e ele teria dito “Let It Be”.

Essa segunda história é a mais provável, pois no take 23, que pode ser encontrado no YouTube, Paul canta o verso “Brother Malcolm comes to me” e mais tarde, Paul substituiu o mesmo verso por “Mother Mary comes to me”. No documentário Get Back, em um momento, Paul pensa em trocar o verso para “Brother Jesus” o que demonstra que o flerte com a temática religiosa era verdadeiro e proposital.

Let It Be é normalmente traduzido como “deixe estar, mas em uma tradução livre seria algo como “deixe ir, “deixe acontecer” ou “deixe passar”. Na verdade a letra é um grande conselho para deixarmos de nos preocupar tanto com os problemas da vida.

As Últimas Faixas

A próxima faixa, Maggie Mae, uma música composta pelos Beatles ainda na época em que eles eram conhecidos como The Quarrymen. Aqui ela aparece como uma grande homenagem ao início de carreira da banda.

I’ve Got a Feeling é um hard rock embrionário, com Paul mostrando em seus vocais que pode deixar de ser um cantor “bonzinho” quando bem entende. Essa música verdadeiramente é uma composição de Lennon-McCartney, já que a música foi criada a partir de duas letras distintas dos dois compositores.

One After 909 é uma composição de John Lennon desde o período dos The Quarrymen que nunca tinha sido usada. Ela resgata a sonoridade dos álbuns Please, Please Me e With The Beatles, causando um sentimento de nostalgia muito forte aos fãs.

The Long and Winding Road é uma composição exclusiva de Paul McCartney, que assim como Let It Be e mostra o quanto ele consegue criar melodias angelicais e espirituais como poucos compositores. Outra semelhança com a faixa já mencionada está no simples e brilhante piano e nos vocais serenos e tranquilos de Paul, como um grande conselheiro vindo do Céu.

For Your Blue é a segunda música de George no álbum, na qual tem forte inspiração no blues rock e no Bob Dylan, do qual era um grande admirador. A letra – assim como Something, que já havia sido composta, mas que apareceria somente no disco seguinte – é totalmente inspirada por sua esposa na época, Pattie Boyd.

Don’t Let Me Down, assim como I’ve Got a Feeling, é um rock um pouco mais pesado.  A composição é de John Lennon, onde claramente a letra é dirigida ao seu novo amor, Yoko Ono.

Get Back, como é bem mostrado no documentário de mesmo nome, é uma composição que Paul McCartney criou despretensiosamente a partir de uma brincadeira com o seu baixo.  A melodia ganhou vida e com isso veio uma letra que aparentemente fala sobre preconceitos contra imigrantes.

Assim se encerra uma das obras primas da maior banda de rock de todos os tempos.