Quando eu penso nas minhas histórias favoritas, alguns atributos surgem na minha mente de imediato: mistério, humor e, em especial, personagens envolventes. Segredos servem para progredir a trama reservando surpresa para clímaxes efetivos. A comédia funciona como um comentário do absurdo que perpassa a narrativa. Por fim, personagens envolventes te pegam pela mão e dão um motivo para você se importar.
Existem inúmeras narrativas que desenvolvem melhor cada elemento acima mencionado, cada uma sendo tecida pelo esforço dos seus autores. Existem poucas que conseguem equilibrar de fato esse tripé que eu tanto ponho valor. Gravity Falls é uma delas.
Lançado em 2012 no canal da Disney, o desenho animado é o trabalho de estreia do seu criador Alex Hirsch. Baseando-se nas aventuras e fantasias dos seus tempos de infância com sua irmã gêmea, ele elaborou a história do casal de gêmeos, Dipper (Jason Ritter) e Mabel Pines (Kristen Schaal), indo passar o verão na casa do seu tio-avô Stan (voz cedida pelo próprio Hirsch) na intrigante e perdida cidade de Gravity Falls.
Com o seu único humor sagaz e sua estrutura narrativa sólida, a série conquistou excelente recepção e cativou um enorme público ao redor do mundo, estabelecendo-se como um programa para todas as idades. Esse resultado foi fruto de um empenho cuidadoso da parte dos seus desenvolvedores, estando presente desde o momento da concepção. Em uma entrevista ao portal online da revista Time, foi perguntado ao Hirsch como ele trabalhou em cima do seu objetivo de tornar acessível sua criação. Ele respondeu o seguinte:
“Existe um jeito de fazer isso e é não pensar em ninguém quando você faz o show. A melhor forma de fazer um programa que irá ressoar [com outras pessoas] é criando um que você adoraria. É confiar em si mesmo, porque não há nenhuma maneira de testar a hipótese. Será que eu acho isso engraçado? Será que eu gosto disso? E se você gosta e acha que é engraçado, portanto você apenas precisa confiar que outros também vão. Eu sou talvez abençoado pelo fato de que eu sou um adulto muito imaturo. Eu sou tipo um crianção, então se eu gosto de algo, é possível que agrada tanto homens como crianças afinal eu estou entre um e outro.”
Ao longo dos seus 40 episódios divididos em duas temporadas, Gravity Falls tece com elegância seus mistérios, entrelaçando-os sensivelmente nas interações do seu elenco. O que causa os fenômenos sobrenaturais? Por que a família Pines parece estar sempre no meio deles? Quem os estudou e registrou nos diários? Ainda que um capítulo possa não estar focado no macro-cosmo dos enigmas, uma nova peça do quebra-cabeça está sempre à disposição.
Entretanto, mais do que uma obra enigmática, seus personagens brilham radiantes. Mais do que indivíduos de duas dimensões com uma quantidade variável de dedos, eles soam reais, com desejos e necessidades críveis. Juntos, eles crescem e se expandem, jamais vítimas de um status quo.
A animação é consistente e formidável, com designs relativamente simples para a maioria do elenco, porém sempre marcantes. A escrita é espirituosa, muitas vezes hilária e inteligente. Esse desenho foi uma surpresa tão positiva para mim na época quando foi lançado que mesmo anos após o seu final eu consigo me lembrar das diversas emoções que eu senti ao ver os seus últimos episódios.
Gravity Falls, com suas risadas e incógnitas, abriu cenário para um espetáculo extraordinário que oferece algo para todos, basta só abraçar o sobrenatural.