Paper Girls: O clima dos anos 80 com a visão feminina adolescente

E mais uma vez, Brian K. Vaughan impressiona com suas HQs. Desta vez, lançado pela Image Comics em 2015, Paper Girls é uma HQ de mistério e ficção científica, publicada no Brasil pela editora Devir. A série já ganhou prêmios, tanto na parte de roteiro, como também por conta da ilustração.  

Como o título já sugere, Paper Girls segue a história de 4 garotas que são entregadoras de jornais. Erin, KJ, Mac e Tiff entregavam jornais na manhã seguinte ao Halloween, mas a cidade é atacada por uma invasão de uma força misteriosa do futuro. Assim, as garotas são envolvidas no conflito entre duas facções guerreiras e viajantes do tempo. O quadrinho é escrito por Brian, mesmo criador de Saga (2012), quadrinho que já analisei aqui no site. O quadrinho teve sua conclusão em 2019.   

Portanto, mais uma vez, Brain trabalha com gênero ficção científica, com propostas e tons bem parecidas com outras histórias que são ambientadas nos anos 80. No entanto, Paper Girls se destaca por trabalhar com a visão de jovens garotas vivendo sua pré-adolescência com aventuras que envolvem mistérios e viagens no tempo. 

Ambientação de Paper Girls

Paper Girls traz um clima bem parecido com Stranger Things, série da Netflix de 2016, onde as duas obras são comparadas favoravelmente por conta da ambientação dos anos 80. Muitos também comparam Paper Girls com a série Dark, também da Netflix, por questões das viagens do tempo que acontecem nas histórias e Super 8, filme de 2011, dirigido por J.J. Abrams, onde também possuem crianças que acabam se envolvendo em uma aventura com alienígenas.  

Mas ainda comparando com Stranger Things, por mais que o clima oitentista é bem pontuado nas duas histórias, junto também com a ideia que os personagens das duas histórias usam bicicletas para andarem pela cidade, o que chama atenção em Paper Girls com certeza é o ponto de vista trabalhado sob mulheres jovens. Como pontua Susana Polo no site Polygon (2020), “se você é um fã de Stranger Things, mas deseja que a série lide com suas personagens femininas, ou sua codificação queer, ou seu amor pela cultura pop dos anos 1980 com um pouco mais de nuance com mais frequência, você encontrará muito do que gostar “.

Outro ponto que chama atenção no quadrinho é a paleta de cores feita por Matt Wilson, que ganhou prêmio de melhor colorista na premiação de Eisner no ano de 2016. A paleta, com cores vivas, de Paper Girls consegue criar um estilo diferenciado e único, casando com a arte feita pelo ilustrador Cliff Chiang. São cores que chamam atenção, criando um tom de mistério que a obra necessita. 

Análise do Enredo 

Como já citado, o que mais chama atenção em Paper Girls é a representação feminina na história. Brian chegou a comentar em uma entrevista para o The Daily Best (2017) que Paper Girls é uma história de 4 garotas de 12 anos que cresceram, como ele, nos subúrbios de Cleveland, nos anos 80. “Elas acabam tropeçando em algo extraordinário e é um mistério, junto com uma aventura, em um livro estranho”. É interessante que, mais uma vez, o autor traz um pouco de suas experiências pessoais para suas quadrinhos. Assim também como Saga, onde pontuei em como o autor consegue trazer inspirações para a construção de universo de sua história.   

Paper Girls trabalha com um tom mais duro quando é mostrado o ponto de vista de adolescentes mulheres. O tom tem uma ideia de despreocupação, mais engraçado, idealizando a “inocência perdida” da infância daquelas garotas que moram no subúrbio de Cleveland e tem seus problemas rotineiros a serem enfrentados. Como chama atenção a relação da personagem Mac e sua madrasta, uma relação que não é totalmente trabalhada, mas já é mostrado grandes contratempos para uma garota de 12 anos enfrentar. 

De todas as histórias citadas no texto, outro ponto que Paper Girls se diferencia é como o conflito é trabalhado. Logo no primeiro volume já temos os problemas aterrorizando a rotina daquelas garotas, mas tudo ainda é incerto, onde as mesmas não sabem exatamente o que estão enfrentando. Mesmo com as ajudas que elas recebem no primeiro volume  dos personagens que, inicialmente pareciam vilões, ainda não sabemos exatamente o que está acontecendo naquele universo. 

Também, o que ajuda essas garotas a ganharem destaque em sua obra é a ausência dos adultos, diferente de Stranger Things que gosta de trazer os personagens mais velhos para as aventuras junto com as crianças. Em Paper Girls, os personagens mais velhos começam a sumir, sem explicação nenhuma, trazendo mais um problema para aquelas garotas. Já em questão narrativa, é interessante ver como as 4 garotas vão se comportar trabalhando sozinhas.  

Portanto, Paper Girls é uma história que, por mais que se assemelhe com outras histórias que trabalhem com ficção científica, mistério e “crianças em bicicletas”, o que se destaca com certeza é essa visão feminina bem dura e certeira para a obra. É um contraste entre pontos fantásticos com a realidade dura que aquelas garotas enfrentam.