Memórias de Um Assassino e a história que chocou a Coreia

Memórias de um assassino

Algum tempo atrás uma história que chocou a Coreia voltou à tona com a confissão e as recentes discussões dos crimes de um serial killer muito conhecido por lá. Esse artigo fala sobre o filme Memórias de Um Assassino, baseado nessa terrível história real. 

O Contexto desse Filme

Os casos de Hwaseong ficaram tão presentes na memória dos sul coreanos que várias obras televisivas e cinematográficas abordaram o assunto. Ou seja, é aí que entra Memórias de Um Assassino. O filme é um drama policial de 2003, com direção de Bong Joon Ho (Mesmo diretor de Parasita) e que utilizou dessa história em seu enredo.

Esse artigo tem referência direta com crimes de assassinato e abuso sexual. Então, se você não curte obras baseadas em fatos ou assuntos fortes como esses, tudo bem não continuar.

Memórias de Um Assassino
© Memories of Murder

Encontrar filmes coreanos que são guiados por histórias reais, como Silenced, The Chaser e A Taxi Driver, é bem comum e muitas costumam ser boas. Porém, o que reacendeu a curiosidade sobre essa história foi o recente avanço da polícia em conseguir solucionar crimes tão horríveis – anos após o filme ter sido lançado e muito mais tempo desde que os crimes ocorreram. Memórias de Um Assassino conta uma história que transmite uma sensação de angústia.

Entendendo o cenário

Na época que os casos de Hwaseong ocorreram, a Coreia do Sul estava passando por um período conturbado. Pouco antes dos assassinatos, havia acontecido um golpe de estado, múltiplas revoltas e até mesmo uma tentativa de reaproximação de famílias que estavam na Coreia do Norte.

© Cena do filme A Taxi Driver

Nos anos 80, a população não estava na mesma página que seus governantes. Em maio de 1980 foi declarada a Lei Marcial, que resultou no Massacre de Gwangju – tema do filme A Taxi Driver (O Motorista de Taxi). Já em 1985, talvez para tentar diminuir a pressão popular, governos da Coreia do Sul e do Norte promoveram visitas entre famílias separadas por esses territórios. Também vale pontuar que um ano após ao primeiro caso de assassinato em Hwaseong, a Coreia do Sul presenciou um forte movimento democrático conhecido como 6월 민주항쟁 (Movimento de Democracia de Junho ou June Struggle). Em resumo, foi um período de muita coisa acontecendo.

Você pode ler mais sobre o Massacre de Gwangju e o Movimento Democrático Coreano nesse texto da Revista Koreain.

A história real dos casos

A história original de Memórias de Um Assassino ocorreu no período de 1986 a 1991. Nessa época, mulheres de 13 a 71 anos foram abusadas sexualmente e assassinadas nos arredores da área rural da província de Gyeonggi.

O assassino e estuprador de Hwaseong foi encontrado em 2019 por meio de correspondência de DNA analisado. Ele já estava preso por ter cometido outro crime e infelizmente não será julgado pelos crimes que começaram em 1986 por já estarem prescritos. Somente em novembro de 2020, o assassino admitiu publicamente ter matado 14 vítimas e que estava surpreso pela demora das investigações.

© Memories of Murder

Ok, mas por que trouxe todos esses fatos?

Pelo filme, temos a impressão de uma polícia sucateada, ao menos em relação à polícia da região. Vemos o início da investigação de uma maneira muito desorganizada e com o foco distorcido. Apesar dessa interpretação do filme, diz-se que foi nessa época que ocorreu uma das maiores mobilizações policiais do país. Os esforços fizeram com que mais de 20 mil pessoas fossem investigadas e tivessem impressões digitais analisadas.

Com 20 anos sem solução, o que restou foram especulações misturadas com indignação e curiosidade. Nesse sentido surgiu o filme, tanto quanto outras obras sobre o assunto.

A base de Memories of Murder

Memories of Murder (Memórias de Um Assassino) tem fortes inspirações de uma peça teatral de 1996 que também traz uma visão sobre os crimes ocorridos em Hwaseong. Entretanto, as influências de outras obras não param por aí: é possível encontrar vários comentários sobre Bong Joon Ho levando em consideração From Hell de Alan Moore.

Essa obra é repleta de humor ácido que provém da troca de cenas, comentários sarcásticos e outros pequenos detalhes. Mas também trabalha o forte retrato de uma sociedade rural que passava por momentos intensos como os descritos no cenário anteriormente. Em especial, destaco também a participação em plano de fundo e a falta de segurança das mulheres. Sendo assim, a trama compara a seriedade de uma investigação criminal com momentos de descaso.

© Memories of Murder

A polícia obviamente tem um grande espaço no filme. Ao longo dos acontecimentos, podemos acompanhar o trabalho de investigação, a brutalidade e a indignação em dissonância. Desde de o começo conturbado e bagunçado até possíveis ideias para encontrar o culpado, a história entrelaça com o oficial e o extraoficial. É como se estivéssemos lá participando da resolução dos casos.

Como é uma obra fictícia, as cenas e personagens podem ser inventados mas é um fato que houve exageros e pontas soltas. Inclusive, vários aspectos do filme batem com a vida real, como acusações falsas que foram esclarecidas depois (Alguns jornais contam sobre pedidos de retratação pelos erros passados da polícia, como neste link – em inglês)

© Memories of Murder

Concluindo

Este é um filme para se ter uma noção de como o cenário na época era, com várias cenas explícitas e um tom bem pesado. Apesar de ser uma obra fictícia e, portanto, ter a interpretação dos autores bem presente, ele vem com um panorama interessante sobre os casos e como afetaram os policiais encarregados. Além disso, é um ponto de partida para comparar com os passos tomados na realidade. Ao mesmo modo, também é uma forma de trazer questionamentos de o que é real e o que foi perdido.

Sinceramente, eu me senti bem incomodada assistindo a esse filme pela atmosfera toda que ele traz e por sempre parecer estar caçando o vento. Assim, parece que é a história de um bando de policiais tentando dar um fim aos crimes para mostrarem eficiência e sem apoio. Com violência e o deboche presentes em quase todos os momentos do filme, Bong Joon Ho mostra sua maneira sórdida de crítica.

E aí, você gosta das obras do Bong Joon Ho?

Informações presentes nesse artigo podem ser encontradas em sites como Korean Herald, New York Times, The Guardian, CNN, Naver e Rotten Tomatoes.

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