Aproveitando o fato de que dia 14 de fevereiro foi o Dia dos Namorados fora do Brasil, resolvi trazer aqui um dos meus filmes de romance favoritos: In the mood for love (nome este que veio da música I’m in the mood for love, de Bryan Ferry). Ele se chama “Amor à flor da pele” no Brasil e seu título original é Faa yeung nin wa, que significa literalmente “Anos como flores”. Dirigido e escrito por Wong Kar-Wai, In the mood for love é estrelado por Tony Leung Chiu-Wai e Maggie Cheung. O filme foi lançado em 2000.
Na Hong Kong dos anos 60, o senhor Chow, editor-chefe de um jornal local, tem sua vida entrelaçada com a da senhora Su Li-zhen, pois os dois descobrem que estão sendo traídos pelos seus respectivos cônjuges. O marido de Su e a mulher de Chow estão tendo um caso e isso acaba aproximando ambos; além disso, os dois casais moram no mesmo prédio, em apartamentos muito próximos.
Começando pela ambientação, a direção de arte é impecável, principalmente nos cenários e nos figurinos, com destaque para os vestidos que Su Li-zhen usa, tipicamente da época. É impossível não se encantar pela Hong Kong dos anos 60 e pelos atores principais e sua beleza. As cores são vivas e quentes, muito vermelho, significando a paixão que está aflorando entre os protagonistas, combinando também com o clima quente da época que é retratada.
É importante citar aqui que nem o marido de Su e nem a esposa de Chow mostram seus rostos, apenas suas vozes. É quase como se os dois fossem fantasmas, presenças que estão sempre ali para assombrar os protagonistas, que começam a ficarem obcecados pela relação de seus cônjuges.
A partir daí, incia-se um jogo de interpretações. Chow começa a interpretar o papel do marido de Su, enquanto que Su interpreta o papel da esposa de Chow. Eles têm como objetivo tentar entender como que os dois se aproximaram. Mas o que eles não esperavam é que também acabariam se envolvendo ainda mais, despertando sentimentos e fazendo com que acabem na mesma situação que seus cônjuges.
O roteiro, inclusive, brinca muito com isso e, por vezes, não deixa claro quem os protagonistas estão sendo: estão sendo eles mesmos ou o outro casal? Isso faz com que tenhamos leituras diferentes para cada cena e muitas vezes somos surpreendidos por uma mudança na atuação de Chow e Su.
Aqui temos um desenvolvimento lento, muito lento. Diria até que não é um filme de romance tradicional. A relação dos protagonistas é bastante casta e eles nunca realmente colocam em prática seus sentimentos. Ao mesmo tempo, a troca de olhares e um simples toque demonstra toda a paixão entre os dois. Chow e Su deixam seus sentimentos quase trancados dentro de si, nunca chegando a superfície. Não é uma atuação fácil, já que muitas vezes não dizer algo é mais difícil do que dizer. Os dois atores se destacam muito, a química deles é boa, e conseguimos sentir o turbilhão de emoções que os dois carregam.
Temos aqui também uma fotografia lindíssima, que usa muito de planos em que um quadro está dentro de outro quadro, ou seja: os personagens estão sempre enquadrados dentro de um espaço físico, como o contorno de uma porta, janela e até mesmo espelho. O reflexo também é muito utilizado, colocando os dois personagens em cena. O uso dos mesmos cenários, como as escadas que levam ao prédio aonde Su e Chow moram e os próprios apartamentos, dão a sensação de rotina, repetição, como quando Su vai buscar várias vezes o seu jantar. Os movimentos de câmera também são muito criativos. Além disso, a trilha sonora é maravilhosa e muito marcante.
O final é, sem dúvidas, uma das partes mais marcantes da história. Vemos os anos se passarem e, consequentemente, Chow e Su se afastando. Na cena final, temos um paralelo entre uma cena do meio do filme, quando Chow fala para um colega de trabalho sobre uma tradição que as pessoas tinham de falar seu maior segredo para um buraco em uma árvore ou parede e depois fechá-lo, selando para sempre ali uma grande confissão. E é o que Chow faz, no fim ele é finalmente capaz de expressar todo os seus sentimentos e só podemos imaginar a intensidade do que ele possa ter falado ali. O filme termina com frases na tela, uma delas falando sobre como o que já foi vivido se passou e tudo o que resta são as lembranças, afinal: “O passado é algo que ele pode ver, mas não tocar.”