A primeira vez que eu tentei assistir à Shingeki no Kyojin (SNK) não consegui me envolver muito com a narrativa. Era 2013, Attack on Titan, como também é chamado, tinha sido lançado não fazia muito tempo e todos meus amigos da escola haviam gostado. A trama era muito diferente daquilo que eu estava acostumada e tão logo perdi o interesse. Somente anos mais tarde, umas duas semanas atrás, que eu finalmente dei a atenção devida.
SNK é a adaptação do mangá homônimo do autor Hajime Isayama. Publicado há dez anos, a obra goza com sucesso de crítica e vendas, além de algumas premiações. Ambientada em territórios protegidos pela muralha, a história aborda os últimos humanos protegendo-se da ameaça de titãs, gigantescos monstros que devoram carne humana. Nesse cenário claustrofóbico e tenso, acompanhamos a luta pela sobrevivência de Eren Jaeger, um rapaz que perdeu tudo (lar, família, senso de dignidade talvez) após o ataque de titãs.
Amargo e resoluto, Eren e seus dois amigos de infância, Mikasa Ackerman e Armin Artlet, se inscrevem no exército com a intenção de extinguir essa ameaça e vingar todas as dores sentidas.
Com uma premissa tão sólida e desesperadora, pensei em me preparar emocionalmente para os baques da trama, porém, naturalmente, não foi suficiente. Desde o primeiro episódio, SNK só introduz desgraça após desgraça, sem deixar algum momento para os personagens ou espectadores respirarem. A impressão que fica é de que os personagens ainda estão para desenvolver Transtorno do Estresse Pós-Traumático (TEPT), só que nunca conseguem pois a tragédia nunca acaba.
Brincadeiras à parte, TEPT é um distúrbio psicológico marcado pelas dificuldades da recuperação após alguma tragédia. É caracterizado pela reação extrema (emocional ou física) a algum gatilho que lembre do evento traumático. O especialista tcheco em Neurociência, Ivan Rektor, divulgou os efeitos fisiológicos do trauma em comunicado: “diferenças substanciais nas estruturas cerebrais envolvidas no processamento de emoção, memória e cognição social”.
Os sobreviventes dos ataques dos titãs têm suas vidas marcadas pelo trauma e, ainda que levem seus dias adiante, é notável como os vestígios do evento se agarram às suas existências. Eles são irritáveis e vingativos, são guerreiros esgotados tentando seguir o seu dia, com as memórias angustiantes pesando no seu cerne. De maneira brilhante, Isayama constrói a sua narrativa gradualmente, dando espaço suficiente para o espectador se apegar ao personagem e criar um baque maior quando o desastre finalmente ocorre.
Se é possível sentir ansiedade com uma série, SNK certamente tem potencial. A tensão é construída de maneira magistral, sutil em muitas partes para amplificar os horrores das revelações. Admito que perdi o fôlego em muitas partes e que até agora não processei todas as emoções sentidas enquanto assistia.
Os personagens são muito bem caracterizados e incorporados à trama e seus temas com maestria. A trilha sonora (que o site já cobriu aqui anteriormente) é brilhante, com músicas que complementam muito bem a temática de luta por sobrevivência. A animação, a cargo do Wit Studio, é muitíssimo boa: bastante fluída, com excelentes cenas de ação, e uma construção narrativa inquietante. Eu não conseguia parar, um episódio imediatamente após o outro. Rapidamente assisti aos 59 capítulos divididos entre três temporadas.
O mundo de Attack on Titan é cruel, atormentado, e inquieto. É assombrado pela dor do que resta após a desgraça. SNK capta esse sofrimento e o traduz numa história agoniante, certamente digna de atenção.
Você pode assistir às três temporadas de Shingeki no Kyojin no serviço de streaming da Crunchyroll.