O silêncio realmente tem muito o que nos dizer e nos ensinar. Sendo assim irei explicar como nesta segunda parte de nossa leitura e análise sobre “A Voz do Silêncio“.
Na última vez, falei sobre o primeiro arco de “A Voz do Silêncio” (Koe no Katachi) destacando alguns pontos sobre o que a obra de Yoshitoki Oima poderia nos ensinar e tratando apenas da infância dos nossos protagonistas: Shōko Nishimiya e Shouya Ishida. Esses dois personagens sofreram bullying, exclusão social e traumas psicológicos quando ainda eram apenas crianças e estudantes do primário. Agora que já estão crescidos (entre seus 17 e 18 anos), terão que lidar com seus problemas e feridas do passado, além de aprender a superá-las.
Antes de prosseguir, se você não viu o filme, leu o mangá ou ainda não leu a 1ª parte deste artigo sobre “A Voz do Silêncio”, onde abordo sobre a infância de Shōko e Shoya, te recomendo que pelo menos leia o artigo, pois ele é fundamental para que você entenda melhor a profundidade de alguns momentos e as ações de alguns personagens. A primeira parte do artigo se encontra disponível clicando neste link aqui: http://bit.ly/nsv-oqueavozdosilenciopodenosensinar-parte1.
Por esta parte do artigo conter um trecho maior da obra e devido a profundidade dela, irei dividir a apresentação dela em capítulos para facilitar tanto o seu entendimento quanto a apresentação do conteúdo. Na nossa próxima leitura iremos fechar a análise da obra.
Aviso: Este artigo contém spoilers de “A Voz do Silêncio”.
Adolescência
Contando os dias e flashbacks.
A história do filme inicia com o protagonista Ishida em sua fase de adolescência e o acompanhamos entre momentos do presente e flashbacks de sua infância. O vemos rasgando um calendário até 15 de abril e contando os dias e compromissos desde o dia 09 de abril. Seguindo seus compromissos conforme o calendário, ele vai se demitindo de seu emprego, vendendo todos seus pertences, sacando as suas economias e juntando todo o dinheiro. Com isso, ele o deixa dentro de um envelope, ao lado de sua mãe enquanto ela dorme, com os dizeres “estou devolvendo seu dinheiro”.
Pensativo, vemos Ishida caminhando por uma ponte muito alta, parar, subir no guarda corpo da ponte e se atirar… ao menos era o que pensávamos ver, pois ele desperta de seus pensamentos, para o momento de uma distração e termina seguindo seu caminho, enquanto lembra de sua infância.
Podemos ser amigos? – O reencontro de Ishida e Nishimiya:
Depois de desistir de tirar sua própria vida, Ishida vai ao um centro comunitário de ensino e por coincidência acaba se encontrando com a Nishimiya. Com essa oportunidade, ele tenta se aproximar dela novamente. Após lhe reconhecer, Shōko acaba sentindo medo, fugindo do protagonista devido às lembranças, do sofrimento e da cicatriz que deixou pelas “brincadeiras” que sofreu no passado.
O protagonista consegue encontrar Nishimiya bastante assustada com a sua presença. Ele entrega o caderno que ela usava para se comunicar na época do primário e conversa utilizando a língua de sinais (JSL ou Nihon Shuwa), que a surpreende.
A sua atitude e tentativa de aproximação a espanta de uma forma positiva e a conversa se encerra com ele pedindo a sua amizade. Finalmente entendendo, junto a visão de uma Shōko em lágrimas (seja por medo de ser ferida ou pela alegria de ele finalmente ter lhe entendido), que ela queria a sua amizade desde o princípio.
Os receios de uma mãe:
Na sua casa, percebemos como o encontro entre os dois protagonistas foi positivo para Ishida e como de certa forma o deu um novo propósito para seus planos iniciais e futuros. Um detalhe importante é que antes dele descer para tomar café da manhã com sua família, é mostrado o calendário que ele rasgou anteriormente estando remendado novamente.
Durante o café da manhã, a uma reunião em família. A mãe de Ishida (Miyako Ishida) aparentando estar feliz pelo esforço de seu filho, por ter juntado uma grande quantidade de dinheiro que conseguiu trabalhando, vendendo todos os seus pertences, como roupas, mangás, dentre outros objetos pessoais; pergunta de forma calma e sorridente, se ele pretendia tirar sua vida.
Sem jeito e tentando se explicar, Shouya assume a sua intenção fazendo com que a sua mãe entrasse em desespero e concluísse o que ela já desconfiava mas não queria acreditar no pior. Miyako ameaça por fogo em todo o dinheiro que ele juntou para pagar pelos problemas que lhe causou. Dentre eles, está a lembrança de ter que pagar os custos de uma mãe, por ter quebrado os aparelhos auditivos de Nishimiya. Diante deste momento tenso e preocupante, Ishida promete que não fará mais nenhum atentado contra a sua vida, deixando sua mãe bastante aliviada.
Mesmo sendo um assunto muito forte para ser tratado na frente de uma criança, o momento era muito preocupante e deve ser visto de modo compreensivo, já que se tratava de um desespero de uma mãe que sentiu medo de ter perdido o seu filho na tentativa deste de tirar a própria vida. Por acidente, dinheiro realmente foi queimado mas a mãe de Ishida fala em outra cena no futuro, que não conseguiria usar o dinheiro que ele arrecadou na intenção de cometer um suícidio logo em seguida.
Fazendo amigos inesperados
O que é um “amigo”? Carma e assumir a responsabilidades… Esses três isolados podem não se parecer em nada ou talvez não faça muito sentido, porém foram com essas três ideias em mente que Ishida foi refletindo enquanto ia para o colégio. Nosso protagonista reflete sobre o seu passado. Sobre o que é ser um “amigo” de verdade, justo quando os amigos que mais prezava durante a infância, o abandonaram quando ele mais precisava e o isolou do contato de outras pessoas. Sobre o carma em relação ao fato dele carregar por tudo que fez a Nishimiya durante a infância. E sobre seu dever em assumir a responsabilidade pelo que fez e que ele deveria se isolar como forma de lhe punir e ficando com seu próprio silêncio.
Ficar em silêncio e isolado do mundo, lhe deu uma visão do não merecimento das pessoas, tornando-o uma pessoa fechada para as outras e também com uma impressão fechada delas. Este sentimento o faz caminhar sem olhar diretamente nos olhos das pessoas, mantendo-se sempre de cabeça abaixada e com a visão de um “X” no rosto delas, como forma de bloqueá-las ou evitá-las.
Já na sala de aula, Ishida ouve comentários cruéis de alguns de seus colegas e lembra do olhar de desprezo que recebeu de Shimada (um de seus amigos de infância). A dura lembrança desse momento o faz lembrar que esta é a realidade e terá que aprender a lidar com ela.
Discretamente, vemos um outro aluno aparentando estar sempre sozinho. Numa cena, vemos Ishida almoçando sozinho no intervalo e esse seu colega fazendo o mesmo, próximo a ele mas sem interagir. Apesar de estudarem na mesma sala, esta é a primeira vez que Shouya vai percebendo e formando uma simpatia pelo seu colega, que é mostrada apenas por troca de olhares rápidos.
Na manhã seguinte, Ishida presencia um acontecimento familiar, semelhante ao que ele fez no passado; acontecendo com este seu colega que até o momento, era apenas um “desconhecido” para ele. Chamado de Tomohiro Nagatsuka, já em estava entrando em pânico por ter a sua bicicleta sendo tomada a força por outra pessoa, a qual se dizia querer apenas “emprestada”. O protagonista decide ajudar e oferece a sua bicicleta em troca para que o rapaz não o incomodasse mais.
Feliz com seu gesto, Nagatsuka consegue encontrar a bicicleta de Ishida e lhe entregar perto de seu endereço como forma de lhe agradecer pela ajuda. Diante de sua atitude, Shouya fica feliz com seu ato e os dois vão se aproximam, tornando-se amigos. A amizade deles se aprofunda mais para a frente da obra.
Começando a entender o real significado de amizade, há um momento que Ishida pergunta sobre a definição de “amigos” e a resposta de Nagatsuka é bem breve e esclarecedor, pois os gestos de seu amigo são simples mas diz muito sobre companheirismo e amizade. Assim, não foi preciso utilizar de muitas palavras, ter qualificações ou qualquer outra coisa para ser amigo de alguém.
Outra amizade inesperada é com Yuzuru Nishimiya. Eles se conhecem quando Shouya tenta se aproximar de Shōko para lhe entregar o pão que comprou especialmente para alimentar as carpas, junto a ela e também pedir desculpas. Porém, Yuzuru termina não deixando a fim de proteger a sua irmã mais velha. Também fez com que Ishida acreditasse que ela, que até o momento se porta como um garoto, era namorado de Nishimiya. Após uma confusão que Nagatsuka fez para ajudar seu amigo, os dois protagonistas conseguem finalmente se encontrar numa ponte próxima ao centro comunitário de estudos. Este local terá muitos encontros importantes para os nossos dois protagonistas durante o filme.
A amizade de Yuzuru com Ishida começa após ele falar de uma briga que teve com a Nishimiya e de ter saído de casa. O protagonista o leva para jantar em sua casa, assim eles vão se conhecendo e descobrindo que Shouya mudou com o tempo. Essa mudança não apenas se percebe pela forma como ele se fecha para o mundo, mas como ele vê a relação dele com a Shōko e pelo seu desejo de não vê-la chorar novamente. Após a caminhada até a casa das Nishimiya, que os dois fazem juntos sobre a chuva, o suposto namorado de Shōko revela que na verdade é a sua irmã caçula.
A aproximação entre Ishida e Nishimiya e a busca pelos velhos amigos:
Voltando ao encontro entre Ishida e Nishimiya na ponte, Shouya confessa que vem pensando sobre o significado de “amigos” e também numa razão para vê-la. Nisso, Shōko diz que estava pensando na mesma coisa e os dois combinam de se encontrarem novamente.
No encontro seguinte, como forma de se aproximar mais de Shōko, Ishida compra um celular e diz que gostaria de manter contato com ela através de e-mail e se tem alguém o qual ela gostaria de adicionar. Então, a nossa protagonista sugere procurar pela sua amiga de infância Miyoko Sahara. Para atender ao pedido de Nishimiya, acontece uma reaproximação com a antiga colega Kawai Miki, que continua estudando na mesma classe que Shouya já que ela sabe onde pode encontrá-la.
Com a ajuda de seus amigos, Shouya e Shōko conseguem pegar um metrô e ir a procura de Sahara. Este momento é um dos mais importantes de “A Voz do Silêncio”, por nos mostrar através de uma conversa por mensagens de celular, o quanto a nossa querida protagonista está feliz e agradecida por Ishida estar lhe ajudando a encontrar a sua amiga, por estar mudando de comportamento e pelos comentários positivos que sua irmã fez sobre ele.
O reencontro das duas amigas às deixam bastantes felizes. Sahara mostra que continuou aprendendo a língua dos sinais e se desculpa por ter sumido. Durante a conversa delas, Ishida sai para fazer uma caminhada e acaba se encontrando com a Naoko Ueno, que estava entregando panfletos de um Clube de Gatos no qual ela trabalha. Ueno acaba evitando de ser vista pelo protagonista ao lhe ver dentro da loja com o Nagatsuka.
Más notícias e encontros desagradáveis:
Podemos ver que o problema auditivo de Shōko Nishimiya vai piorando, fazendo com que ela perca totalmente a audição em um de seus ouvidos. Com isso, ela passa a utilizar apenas um aparelho auditivo. Enquanto sua avó está triste com a situação da neta, a jovem dar um sorriso como forma de tranquilizá-la. Yuzuru, que foi entregar um presente que Ishida comprou, consegue ver o sofrimento de sua irmã, ficando bastante triste e preocupada.
No dia seguinte, Ishida acaba sendo surpreendido por Naoko Ueno ter lhe encontrado. Ela se desculpa pelo que fez no fundamental, o chama para saírem juntos e relembrar coisas do passado. Ao ver a Nishimiya numa floricultura, Ueno volta a tirar sarro dela, achando que continua sozinha. Para a sua surpresa, Shouya diz que está a acompanhando, pedindo em seguida para sair de cima de sua bicicleta. Não gostando da situação, ela acaba correndo em sua frente ao encontro de Shōko, tomando assim o seu aparelho auditivo e pedindo que ele jogue para longe como fazia em sua infância.
Shouya toma o aparelho e entrega de volta para a Shōko. Revoltada e não acreditando no que estava presenciando, Ueno começar a achar patético e engraçado a amizade dos dois, não acreditando na mudança de seu amigo, indo embora logo em seguida. Ishida se esquiva um tanto da conversa quando Shōko pergunta sobre o que eles estavam conversando, se despedindo com a visível expressão de desconforto após o encontro com a sua antiga amiga. Naoko Ueno terá um foco importante na parte 3 de nossa leitura sobre “A Voz do Silêncio”, além de falar sobre as consequências que algumas palavras ou atitudes podem fazer contra alguém.
O que podemos aprender nesta parte de “A Voz do Silêncio”:
A “Voz do Silêncio” nos ensina que amigos de verdade são aqueles acontecem de forma inesperada em nossas vidas e que nos aceitam do jeito que somos. Que ficam do nosso lado e nos dão conselhos para ajudar a nos tornarmos pessoas melhores, crescer a cada dia, aprendendo e superando os nossos erros.
Ishida foi descobrindo o real significado de amizade depois que conheceu Nagatsuka, que também não tinha amigos; e com a Yuzuru Nishimiya, que além de amiga, se tornou parte de sua família; ao vermos uma cena em que Yuzu visita a família de Ishida para brincar com a sobrinha dele, Maria. Também aprendeu que a garota que a chamava de “anormal”, queria ser sua amiga desde o início e ele só descobriu depois que aprendeu a língua dos sinais para se comunicar com ela, já que só a intimidava quando eram crianças. A amizade dos nossos protagonistas e a família deles foram fundamentais nos seus aprendizados e nas superações de seus medos, que irei aprofundar mais na parte 3 de nossa leitura.
Se estiver precisando conversar, ter apoio emocional ou suporte psicológico, recomendo entrar em contato com a CVV (Centro de Valorização da Vida) pelo número 188 ou acessando no link que disponibilizamos, para mais informações ou para saber outros meios de contato: https://www.cvv.org.br/.
Por estarmos no mês de Setembro Amarelo trarei conteúdos voltados a depressão e ansiedade, abordando sobre como podemos lhe dar com estas situações sendo sempre de forma atenciosa e com bastante cuidado.
Espero que tenham gostado da matéria. Se cuidem e até mais.