O nome Ghibli carrega muito significado para mim, desde que eu era uma menina pequena. Lembro-me de assistir à Viagem de Chihiro no cinema com minha mãe, e de me encantar com o espetáculo visual próprio daquele estúdio. Anos depois, após ver vários filmes do seu catálogo, foi-me recomendado um jogo cujo design tinha sido todo elaborado pelo Ghibli, o Ni no Kuni: Wrath of the White Witch.
Instantaneamente, o jogo tornou-se um dos meus favoritos, zerei com lágrimas nos olhos. Eu estava ansiosa por mais conteúdo, e o segundo jogo não serviu muito para saciar essa vontade, embora eu tenha gostado muito. Quando soube que uma adaptação estava a caminho, fiquei empolgadíssima. Um filme ambientado em um dos meus universos favoritos? Vi todos os trailers, fiquei animada com cada anúncio de lançamento. O que poderia dar errado?
Bem, você leu o título dessa crítica.
Vamos lá.
Ni no Kuni (título que pode significar “Outro Mundo”/”Segundo Mundo”) é uma série de, até agora, dois videogames desenvolvida pela Level-5. Cada um deles, o jogador acompanha um indivíduo do nosso mundo (no primeiro, Olliver; e no segundo, ainda que num papel secundário, Roland) em sua jornada nessa dimensão fantástica. O filme também segue esse padrão, sendo ambientado nesse “Outro Mundo”, porém mais genérico que as versões exploradas pela outra mídia.
Desta vez, os protagonistas são os colegiais Yu, um menino confinado à cadeira de rodas, e Haru, seu melhor amigo atleta. Eles seguem seus dias como adolescentes japoneses medianos, até que um incidente os leva ao Segundo Mundo, onde magia é real e o Yu pode andar. Eventualmente, eles se envolvem com uma guerra, e cada um dos amigos alia-se a um lado do conflito.
Honestamente, foi uma das minhas maiores decepções do audiovisual, ganhando facinho em categoria de desgosto do infame Esquadrão Suicida. A história é muito genérica e desde o primeiro instante eu consegui adivinhar as revelações do roteiro, impedindo qualquer surpresa. Os diálogos são muito expositivos, e muitas vezes mal escritos, o que impossibilitou aparecer qualquer senso de verossimilhança ou genuinidade. Os personagens parecem mais rascunhos, sem alguma personalidade muito elaborada.
Para não ser apenas negativa, concederei que a arte é muito boa. Os cenários são lindos, os designs de personagens são interessantes, e o uso de cores é excelente. Ghibli não teve envolvimento direto, só trabalhando no primeiro jogo, porém os elementos de sua identidade criativa estão aí: foi como se copiassem alguma obra do estúdio, roubando seus componentes mais marcantes, no entanto, sem captar a essência. Era como um bolo de puro glacê, enjoativo embora belo. A dublagem também está bem trabalhada, e, às vezes, era o que salvava umas falas mal elaboradas, porém eu não esperaria nada menos dos nossos profissionais.
Não sei porque eu continuei vendo. Quiçá um misto de masoquismo com curiosidade; talvez uma esperança de que, uma vez a situação resolvida, as peças se encaixariam. Em dados instantes, era possível capturar detalhes do meu amado jogo: o uso de uma música da trilha sonora original, ou o design de algum objeto. De qualquer forma, seja à base da auto-enganação ou da indignação, eu terminei o filme. Se eu recomendo? Não. Se gostar de jogos de RPG, e tiver consoles japoneses (Nintendo Switch ou Playstation 4), jogue os originais.
Ni no Kuni: Wrath of the White Witch é uma obra muito significativa para mim, e, mesmo anos depois de ter zerado, eu ainda carrego no coração a sua história fenomenal. Saber que a sua adaptação para minha mídia favorita resultou nesse absoluto fracasso de vendas e recepção traz um sabor amargo à boca. Espero que o futuro guarde novidades melhores.
Se ainda assim desejar assistir ao filme de Ni no Kuni, pode encontrá-lo no catálogo da Netflix.