Você já se perdeu em alguma cidade grande? Distante da sua zona de conforto, apenas o caos o envolve, deixando a paisagem intimidadora e as pessoas mais ainda. É um cenário curioso, um ambiente ainda não decifrado, alimentado pela discórdia própria que só o organismo citadino pode proporcionar. É nessa anarquia urbana peculiar onde Durarara!! (2010) encontra seu ritmo.
Originalmente uma light novel lançada em 2004, Durarara!! é a terceira série de romances visuais produzida por Ryōgo Narita, já consagrado por Baccano!, e foi ilustrada pelo Suzuhito Yasuda. Ambientada no movimentado distrito comercial Ikebukuro, em Tóquio, acompanhamos a desordem humana delineada por um elenco muito colorido e diverso de, aproximadamente, 20 indivíduos, cada qual com sua história.
Ainda que a ideia de acompanhar vários personagens em suas diversas linhas narrativas possa parecer bizarro, a execução é desenvolvida de maneira sutil e gradual, integrando cada elemento organicamente. Mesclando a rotina urbana com o sobrenatural, a história empurra o protagonismo de outra figura: Ikebukuro em si. O distrito se expande e avança nas vidas dos seus agentes, mudando-os e sendo transformado por eles.
Num primeiro momento acreditamos que estamos acompanhando o Mikado Ryugamine, menino de interior que vem estudar seu ensino médio na capital, porém, no episódio seguinte, já assistimos a outra vida na tela. Gradativamente, o elenco é apresentado e conectado dentro do espaço urbano. Somos expostos ao crime, com as gangues – em destaque Dollars e Lenços Amarelos, ao submundo da indústria farmacêutica, e também ao oculto, com a Saika, a lâmina assassina possuída e com a Celty Sturluson, uma dullahan (cavaleira sem cabeça irlandesa) motociclista.
Intrinsecamente localizado na Tóquio do início do século XXI, a série se faz valer com a comentários sobre a sociedade citadina japonesa, erguendo observações – sem algum juízo de valor específico – sobre os diversos estilos de vida existentes nesse ambiente. Entre as diversas tramas interlaçadas, o cenário pulsa com a existência colorida de seus inúmeros habitantes.
Seu próprio nome já ilustra essa anarquia narrativa. Durarara!! – sim, com duas exclamações – recebe esse nome apenas porque sim. No posfácio do primeiro romance, Narita disse o seguinte: “Você não fica um pouco intrigado apenas olhando o título? Mas se já terminou de ler a história então… Você ainda não entende o significado por trás, certo? Tudo aconteceu quando eu estava editando o rascunho final do livro quando meu editou ligou e perguntou: ‘Não é hora de dar um título oficial para passar ao departamento de Relações Públicas?’. Então eu só dei um nome aleatoriamente, ‘Du… Durarara?’”. A confusão do nome prepara já uma metanarrativa para o espectador e, por si só, já é um mérito do seu autor.
Com conceitos e histórias únicos, Durarara!! tem tudo para ser uma das melhores séries de todos os tempos, entretanto acredito que Norita deu um passo maior que a perna. Sua visão ficcional de Ikebukuro é muito ambiciosa, o que torna difícil o equilíbrio entre os pontos de vistas existentes e seus distintos tons. É um esforço impressionante do criador, porém a maioria dos seus personagens não carrega o momento devidamente.
Ao longo dos 24 episódios da sua primeira temporada, minha frustração crescia entre os diversos núcleos e, salvo marcados instantes de cada episódio, eu não conseguia gostar do que passava na tela. A animação não é especial, apesar de ser competente o bastante, a interpretação dos seus atores é muito boa – cheia de charme e personalidade, e, como já estabelecemos, sua premissa é muitíssimo boa. Ainda assim, é uma pequena decepção para as expectativas que criei com a atenção que eu me lembro ter recebido na época do seu lançamento.
De qualquer forma, Durarara!! oferece uma trama provocante e digna de atenção. A metaficcional Ikebukuro vem à vida de forma instigante e consegue cativar em seus momentos altos. Vim pelos personagens, porém fiquei pela desordem urbana.
Você pode assistir a todas as temporadas de Durarara!! no serviço de streaming Crunchyroll.