Há algo no horror que me atrai como uma mariposa às chamas: é atraente, misterioso, destrutivo. Algo na sua construção – primariamente psicológica, ao contrário do terror que tende a ser físico – que me fascina e me faz voltar de tempos em tempos às suas narrativas intrigantes. É o medo. É a tensão. É a antecipação. É a sensação de cair e esperar o chão vir de encontro violentamente contra seu peito. Eu odeio profundamente essas emoções todas.
Detesto a ansiedade que se aloja em minha mente, esperando o próximo perigo alcançar o protagonista da mídia que estou consumindo. Odeio como o pânico me envolve como um saco plástico na minha cabeça, sufocando-me. Entretanto, ainda como a tola que sou, arrasto-me para a próxima história inquietante com um desejo de decifrar seus segredos. Sou assim desde criança, e foi pela minha curiosidade do insólito apavorante que O Estranho Mundo de Jack me conquistou.
Imaginado por Tim Burton, e realizado pelo excelente Henry Selick, The Nightmare Before Christmas – como é chamado em inglês – é uma fábula macabra sobre a busca por pertencimento. Jack Esqueleto é o rei da data do Dia das Bruxas responsável pelo desenvolvimento das atividades relacionadas ao pavor do dia 31 de outubro. Extremamente reverenciado e reconhecido em seu papel, Jack sente-se insuficiente e anseia por algo mais. Angustiado, ele rouba para si o comando do feriado do Natal e substitui o Papai Noel por sua versão mórbida e retorcida.
Lançado em 1993 para uma recepção morna (bilheteria de US$ 50 milhões), vagarosamente conquistou seu espaço como um clássico do horror da Disney para a família inteira. O estilo artístico de Burton, decrépito e esquálido, enfeitiçou inúmeros espectadores na trama trágica de Jack, exibida ano após ano na programação de Halloween para crianças, o que manteve seu legado vivo mesmo após décadas. Com entrada sutil no mercado, hoje em dia Jack é um rosto conhecido nos mais diversos produtos – desde capa de caderno a camisas, ou mesmo videogames, com sua participação na série Kingdom Hearts.
Não surpreende ninguém afirmar que a animação na técnica stop-motion casou perfeitamente com a estética mórbida do filme. O movimento doentio dos personagens – próximo ao de um ser real, mas ainda enervante – ressalta o elemento de desconforto com maestria. Henry Selick, animador especialista nessa prática, foi a escolha ideal para o tom elaborado por Burton em seu rascunho. Consagrado com o bizarro e apavorante, ele comentou em uma entrevista de 2015 que tem “uma afinidade natural pelo teor, assustador porém divertido. E realizar [o filme] em stop-motion foi a melhor escolha de meio para carregar esse tom. Eu penso no stop-motion como inerentemente um pouco arrepiante, com as coisas se movendo sozinhas – porém, associado aos designs um tanto cartunescos, é como se fossem brinquedos vindo à vida, o que por si só já é arrepiante”.
The Nightmare Before Christmas, contudo, não é somente uma história da ordem do pavor, porém uma narrativa completa. Seu protagonista tem anseios muito reais, e sua compreensão de mundo – apesar de torta – é compreensível, o que gera empatia do espectador. Os cenários, ainda que surreais, se sobressaem com personalidade e carisma, com sua conjuntura cativante, embora repulsiva. A trilha sonora é fenomenal com as produções de Danny Elfman, compondo uma ambiência elegante e assombrosa.
O Estranho Mundo de Jack foi a minha entrada no horror: simples, porém com nuances. Como um peixe abissal, fisgou-me com uma isca luminosa, prendendo-me para sempre no mar de histórias de medo.
Você pode assistir ao Estranho Mundo de Jack no serviço de streaming da Netflix.